Publicado em Çopyright 66, 7 Novembro 1998 • Em Non! – crítica & intervenção
Na sociedade ocidental actual os três objectos (língua, corpo, estado nacional) que fazem referência a três âmbitos fundamentais da pessoa (o simbólico, o fisiológico, o social) sujeitam-se a um jogo entrecruzado de analogias com as quais entendemos e construímos um âmbito por meio do outro. Os três (língua, corpo, estado) são espaços minuciosamente territorializados e articulados polo discurso. Os discursos quotidianos, com as suas visões fortemente enraizadas de “como são as cousas”, constroem as nações-estado em termos orgânicos, como seres vivos cujas partes devem coerir, a risco de ficarem mancados: como uma árvore a que se lhe não podem cortar pôlas, como um corpo que não deve perder membros ou fetos. As línguas são também concebidas como realidades orgânicas que nascem, crescem, vivem, reproduzem-se e morrem, e que são mesmo invadidas por colonos alheios (“impurezas”) que as infectam e até as fagocitam. Os vírus das línguas são os “estrangeirismos”, os vírus dos estados são os “terrorismos”, os terroristas dos corpos são os vírus. O inimigo duma língua é outra língua, o inimigo dum estado é outro estado, o inimigo do corpo masculino é o corpo feminino.