Publicado em Çopyright 10, 30 Julho 1996
UM
A realidade compõe-se de um número impreciso de mundos concêntricos de verdade e falsidade, todos eles cruzados por frechas de linguagem, o único material que nos resta para exprimirmos a complexidade e o assombro. Onde começarmos é sempre a tarefa mais inumana, quase impia, pois em articularmos um desses espaços de realidade por meio da linguagem ignoramos os outros. Isto é o que me acontece hoje, forçado a converter em território plano de palavras as multíplices dimensões dos signos do social. O quem sou, o quem me defende realmente detrás deste triste discurso, é talvez a questão acessória: o perigo é aceitarmos a estrita limitação do texto, a sua falácia, como se a razão de o texto não nos revelar a verdade fosse simplesmente uma carência nossa, não a carência imanente dos objectos.