Publicado em A Nosa Terra
Eu fum um meninho burguês, como se ainda existissem dous grandes bandos que se dividem o nosso escasso território. Conhecim a voz do galego através de gentes inevitavelmente subordinadas que aturavam a minha insolência de rapaz e cuidavam da minha curiosidade espanhol-falante. Para mim, o verão na casa da praia era o estrangeiro, onde homens escuros desafiavam o mar cada alvorada com gamelas e vozes numa linguagem dura como pedra e mulheres roxas cruzavam a estrada deserta levando a cabra a pastar e homens lunáticos que se chamavam Jacinto iam sempre apanhar uma pouca de erva e lembravam-nos que o mundo, daquela, era pequeno e consistia sobretudo na tarefa cotiã de apanhar uma pouca de erva, de pescar umas rinchas, de turrar dos bois polo alcatrão quente da estrada ainda solitária, como uma negra cobra dormida ao sol de Julho. Assim era a vida então. Eu era um meninho burguês, de cidade chula no Sudoeste da Galiza, um burgo que apodrecia como melhor sabia na sua mestiçagem entre galega e cubana e nacional-sindicalista. Esse era o meu mundo de verdade. Galiza era o estrangeiro.
Continue reading “Nostalgia das vozes da costa que soavam estrangeiras”